Especial: Carlos Saldanha – Brasilidade na animação internacional

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Assim que pensamos sobre figuras da animação brasileira, pairam em nossas mentes nomes como Alê Abreu, Victor Hugo-Borges, Zé Brandão e Mariana Caltabiano, mas no quesito de brasileiros na animação internacional, o nome do animador e diretor carioca Carlos Saldanha vem em primeiro. Carlos é conhecido internacionalmente por seu trabalho na finada Blue Sky Studios, estúdio que produziu sucessos como os três primeiros filmes da saga d’A Era do Gelo, a duologia Rio e O Touro Ferdinando. Neste especial, vamos conhecer a história do maior animador brasileiro na indústria internacional da animação.

Carlos nasceu no Rio de Janeiro em 24 de janeiro de 1965, onde cresceu no bairro Marechal Hermes. Na infância, ele assistia longas de animação, principalmente da Disney. Embora amasse animações e desenhar desde cedo, já adulto, inicialmente considerou uma carreira em ciência da computação, pois achava que a arte não fosse uma opção viável. Isso mudou quando ele percebeu como a computação gráfica estava revolucionando o conceito e o programa de educação continuada da School of Visual Arts (SVA) em Manhattan, Nova York. Ele ingressou no programa para se especializar em animação por computador, onde soube desde o primeiro dia de aula que era isso que ele queria fazer para o resto de sua vida. Um de seus instrutores que reconheceu o seu talento, o convenceu a se matricular no programa de mestrado em belas artes da escola.

Embora Carlos Saldanha e sua esposa, Isabella Scarpa, achassem que isso era um risco, optaram por permanecer em Manhattan para que Saldanha pudesse cursá-lo. Enquanto estava na SVA, ele concluiu dois curtas-metragens premiados que foram exibidos em festivais de cinema ao redor do mundo. Foi também na escola que ele conheceu o seu instrutor que seria mais tarde o seu futuro colaborador na animação, Chris Wedge, que o convidou para se juntar a saudosa Blue Sky Studios, estúdio de Chris que foi fundado em 1987. Carlos se formou na SVA com um mestrado em Arte Computacional em 1993 e foi contratado pelo estúdio, onde ele posteriormente dirigiu alguns comerciais.

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Na Blue Sky, que foi adquirida mais tarde pela 20th Century Fox em 1997 através da divisão VIFX, ele trabalhou em produções como Joe e as Baratas, da MTV, e Clube da Luta, da Fox. Animou o curta dirigido por Wedge, Bunny, que vinha trabalhando desde 1990 para demonstrar o CGI Studio. Na época da SVA, Chris compartilhou painéis de storyboard da animação com Saldanha durante esse período; tornou-se vencedor do Oscar de Melhor Curta Animado em 1999, sendo o único Oscar conquistado pelo estúdio durante a sua existência. No mesmo ano, a Fox vendeu a VIFX para outra empresa de efeitos visuais e animação, Rhythm & Hues, enquanto a Blue Sky Studios permaneceu sob o controle deles, porém, o estúdio também considerou sua venda por problemas financeiros, que seriam revertidos por decorrência de um ambicioso projeto chamado A Era do Gelo.

A produção foi apresentada à 20th Century Fox em 1997 pela produtora Lori Forte, sendo originalmente concebida como uma animação tradicional em tom de comédia dramática voltada para a ação.

O primeiro Era do Gelo fez uma grande bilheteria no mundo e foi muito bem recebido pela crítica e público, sendo inclusive indicado ao Oscar de Melhor Filme de Animação em 2003. Carlos dirigiu o curta solo do Scrat, Gone Nutty que foi lançado no home vídeo no ano seguinte.

20th Century Animation / Divulgação

Na mesma parceria com Chris, eles dirigiram o longa Robôs de 2005. A partir daí, Carlos seguiria sozinho na franquia pré-histórica em A Era do Gelo 2, em 2006. Aqui, um de seus primeiros contrapontos. Enquanto os críticos ficaram divididos, o público recebeu bem. Por fim A Era do Gelo 3, que seria o último filme dirigido por Saldanha.

Contudo, o cineasta ainda criaria a obra que viria a se tornar a segunda maior franquia da Blue Sky Studios, e uma de suas mais proeminentes: Rio, de 2011. Ele teve a ideia inicial para o filme em 2006, que originalmente envolvia um pinguim nas praias de Ipanema; mas que precisou ser alterada por similaridades como Happy Feet e Tá Dando Onda. Rodeado por referências a cultura brasileira, Rio foi um enorme sucesso, principalmente em nosso país, que incluía ainda músicas de artistas renomados como o saudoso Sérgio Mendes, Carlinhos Brown, Mikael Mutti, Gracinha Leporace e Bebel Gilberto. É uma carta de amor maravilinda para a cidade do Rio de Janeiro onde Saldanha nasceu.

20th Century Animation / Divulgação

Com o sucesso, veio a sequência em 2014, Rio 2, que levava a trama do Rio para a Amazônia. Apesar de uma recepção mista, o longa seguiu com bastante êxito entre o público, além de uma importante mensagem de reflexão para preservação de nossas florestas.

Infelizmente um terceiro filme, que é de interesse do animador, parece cada vez mais distante, tendo em vista o encerramento da Blue Sky em 2021, partindo da Disney decidir quanto a uma provável nova produção.

Chegamos então a O Touro Ferdinando, de 2017, o último longa dirigido por Saldanha no estúdio antes de seu encerramento, sendo um dos melhores trabalhos da Blue Sky Studios, mesmo que menos considerado pelo grande público.

Após o fechamento da Blue Sky, o cineasta partiu para novas frentes, como a Netflix e Star+, onde comandou projetos como Cidade Invisível e How to Be a Carioca, além de Harold e o Lápis Mágico, estrelado por Zachary Levi (Shazam), no ano passado. A experiência dele com as produções live-action havia começado em Eu Te Amo, Rio de 2014. Para o futuro, uma animação de Horácio, personagem do cartunista Mauricio de Sousa, está nos planos.

O produtor foi agraciado com a Ordem do Mérito Cultural em 2018, uma honraria que raramente é concedida pelo Governo do Brasil a animadores. Infelizmente este reconhecimento sempre foi negligenciado ao longo dos anos, apesar da animação ser responsável por integrar temas como perda, união, amor e esperança, as vezes de modo tão sutil, a milhões de pessoas.

Carlos Saldanha é um maravilhoso animador e diretor que representa magistralmente o Brasil nas telas pelo mundo. Ele deixa sua marca e de todo um país a cada novo trabalho. E que venham muitos pela frente!

*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não remete necessariamente a posição do ANMTV*