Sakura Card Captors: um anime mágico

Sakura Card CaptorsOs animes nem sempre foram raros na TV. Os canais costumavam oferecer uma variedade muito boa de programas, mas o tempo passa e as coisas mudam. Infelizmente, as mudanças nem sempre são boas e, para os fãs da animação japonesa, a mudança foi pior ainda, pois onde antes se encontrava variedade, hoje existe escassez, e só nos restam agora as boas lembranças de uma época em que o equilíbrio era inquestionável. E no meio dessas maravilhosas lembranças está um dos mahō shōjo mais conhecidos e mais encantadores.

Criação do grupo Clamp, Cardcaptor Sakura, ou, como ficou conhecido no Brasil, Sakura Card Captors, conta a história de Sakura Kinomoto, uma garota de 10 anos que, acidentalmente, liberta várias cartas estranhas. Ela também acaba despertando o guardião das cartas, Kerberos (Kero), que lhe explica que todas as cartas foram espalhadas pela cidade, e que agora cabe a Sakura a tarefa de selar e reunir todas as cartas, conhecidas como Cartas Clow. O anime, que estreou em 7 de abril de 1998, rendeu 70 episódios, divididos em 3 temporadas, 2 filmes e 4 especiais. No Brasil, o anime foi exibido nos canais pagos Cartoon Network e Boomerang, e na TV aberta pela Rede Globo. No entanto, dos dois filmes, só o segundo foi exibido no nosso país.

A série se destaca por vários motivos, entre eles a atenção aos detalhes. Mostrando um empenho admirável, a série apresenta roupas diferentes a cada episódio, desfazendo aquele costume de manter cada personagem vestido da mesma forma. Isso pode até aparentar não ter importância, mas a variedade surpreende, e traz um atrativo a mais. Tomoyo, a melhor amiga de Sakura, confecciona roupas espetaculares para Sakura usar durante suas batalhas para selar as Cartas Clow, e estas roupas não poderiam ser mais perfeitas para representar o estilo mahō shōjo.

Com um objetivo fixo explicado logo de inicio, Cardcaptor Sakura corria o risco de ser mais um daqueles animes repetitivos e cansativos. Felizmente, isso não aconteceu. Sempre que a série encontra um único caminho, ela nos apresenta novos personagens e novos mistérios sobre as cartas, impedindo a trama de ficar monótona e ganhando a sua atenção para você desejar saber como tudo aquilo vai acabar. E o anime acaba tomando um rumo imprevisível, já que, provavelmente, boa parte das pessoas que acompanharam a série acreditavam que tudo estaria acabado quando todas as cartas fossem recolhidas.

Mas a parte mais interessante está na habilidade de mexer com assuntos polêmicos de forma sutil. Por trás da imagem fofinha que o anime tem, temas que poderiam causar revolta e desconforto são exibidos no decorrer dos episódios. Existe a relação entre Tōya, irmão mais velho de Sakura, e seu melhor amigo Yukito. Mas como foi dito, tudo é feito de um jeito muito sutil, e esta relação é apresentada por pequenos sinais, como foi feito num episódio em que algumas garotas discutem sobre o estranho fato de Tōya e Yukito, os mais populares de sua classe, serem os únicos garotos sem namoradas. Outro sinal foi a confissão de uma garota para Tōya, que acaba respondendo que já gosta de outra pessoa.

E as relações incomuns não param por aí. Rika, uma das colegas de classe de Sakura, é apaixonada por seu professor, Terada. Ela sempre é descrita por seus amigos como uma garota madura e sensata, e esta maturidade talvez seja a causa de seu interesse por um homem bem mais velho. Sakura é apaixonada por Yukito, também mais velho, mas esta paixão acaba sendo diferente se comparado com o caso de Rika, pois o amor de Sakura é bem mais infantil e inocente. Também somos apresentados a teatros escolares estranhos, em que as pessoas se vestem com roupas do gênero oposto. E, para finalizar, temos o caso de Tomoyo que, aparentemente, sente mais que amizade por Sakura, pois num dos episódios ela diz que, às vezes, o importante é ver quem você ama feliz, mesmo não sendo da forma esperada.

No entanto, estes assuntos nunca parecem forçados. É incrível o equilíbrio que este anime conseguiu para tratar de assuntos que afastam as pessoas com tanta facilidade. Talvez a sutileza ajude, e a sensação de aquilo só estar ali para divertir pode ser o principal motivo para esses relacionamentos não comprometerem a qualidade da série.

Entre os detalhes trabalhados com maestria no anime está a mãe de Sakura, Nadeshiko. No primeiro episódio somos apresentados a toda a família Kinomoto, e logo ficamos sabendo que a mãe de Sakura está morta. É natural este tipo de situação explicar a ausência da personagem, mas a mãe de Sakura não fica totalmente fora de cena. É possível saber mais sobre a personagem em alguns episódios, que revelam que ela casou muito cedo, e que seu casamento não foi bem aceito por sua família. Esta situação viria a render uma cena muito bonita, onde o avô de Nadeshiko finalmente reconhece que sua neta fez uma boa escolha.

O trabalho realizado com as personagens não poderia ser melhor, pois todos estão ali por algum motivo, mesmo sendo só para trazer cenas cômicas ao anime. Acompanhar o crescimento de cada um deles é maravilhoso, especialmente o Li Shaoran, que inicialmente era um garoto amargo e egoísta, que acreditava que Sakura era incompetente demais para capturar as cartas. Mas a convivência com Sakura acaba trazendo mudanças, e ele mesmo admite o quanto era egoísta antes de conhecê-la.

Quebrando preconceitos, Cardcaptor Sakura atraiu a atenção de meninos e meninas de todas as idades. Com características únicas e personagens encantadores, o anime com certeza merece toda a atenção que recebeu e ainda recebe. Foi, sem duvida, uma das maiores joias da animação japonesa exibidas no Brasil. E sempre existe tempo para rever séries de qualidade, então, liberte-se de seus empecilhos e acompanhe mais uma vez este clássico que oferece uma boa dose de nostalgia e diversão.