Em uma realidade onde os “Ajin” (meio-humanos) aos poucos começam a serem aceitos no convívio social entre os homens, conhecemos a história do professor de biologia Tesuo Takahashi, que além de se interessar muito sobre os ajins, pensa em produzir um estudo sobre os mesmos, que também podem ser chamados de Demis. Para isso ele conta com a ajuda de suas alunas Hikari Takanashi, uma vampira, Kyouko Machi, uma dullahan, Yuki Kusakabe, uma mulher da neve e, mais pra frente, a nova companheira de trabalho e professora de matemática, a súcubo Sakie Satou.
É com essa sinopse que adentramos no Universo de “Interviews with Monster Girls” (Demi-chan wa Kataritai), uma das várias obras disponíveis no catálogo da Crunchyroll e que inesperadamente se mostrou ser uma boa surpresa pra este que vos escreve.
Em termos básicos, Interviews with Monster Girls pode parecer só mais um anime de meninas fofas vivendo seus dilemas juvenis com algum quê de fantasia, ao qual você pode assistir sem se preocupar em pensar muito sobre a história. E de fato, é isso mesmo, uma boa opção para acompanhar depois de um longo dia de tarefas cumpridas – tanto é verdade, que essa foi a minha intenção quando comecei a assistir a obra, confesso.
No entanto, para os mais atentos, o anime vai um pouco mais além da sua aparente abordagem “água com açúcar” e acaba por deixar algumas pérolas ao longo do caminho, que nos levam a pensar – ainda que não sendo sua prioridade – em assuntos pertinentes a serem discutidos no mundo real. Um exemplo disso, e que eventualmente é usado na internet em vídeos de análise sobre a obra ou em redes sociais, é uma fala pronunciada pelo professor Takahashi à personagem Himari (irmã humana de Hikari) a respeito das naturezas humana e monstruosa das demis:
“O jeito como a gente nasce não define como a gente vai ser. O que define é a maneira como nós vivemos. Isso não significa que é certo negligenciar o entendimento da natureza de um demi. Os problemas únicos são causados pelas suas naturezas demis. É preciso olhar de ambas as perspectivas. Se enxergar só traços de demis, não verá a individualidade. Se enxergar só o lado humano, não vai entender os seus problemas…o que importa é o equilíbrio”
Exclusão social, minorias e empatia
Falas como a do parágrafo anterior, apesar de vagas ou genéricas, quando inseridas dentro da narrativa da história podem remeter ao espectador aos mais diversos casos de exclusão social iniciados a partir de uma visão egocêntrica do que é “certo”. Desde um episódio de isolamento em ambiente escolar (e aqui podemos incluir desde o isolamento de um grupo de alunos para com um colega discente ou a falta de estrutura das escolas para com alunos portadores de necessidades especiais, o que também caracteriza como uma forma de exclusão) até casos de segregação mais sérios e de escala mundial, como o apartheid (regime de segregação racial implementado na África do Sul) e o machismo, o qual tem como um dos seus muitos alvos, a comunidade LGBTQIA+ e suas práticas (consideradas em 69 países algo criminoso e por vezes punidos com a morte)
Olhando “Interviews with Monster Girls” por essa ótica, é difícil não se deixar levar até o fim de cada episódio, principalmente se você faz parte ou possui alguma relação com alguma minoria social, pois de uma maneira tão sutil quanto uma brisa de verão, somos confrontados com realidades vividas por muitos em nossa sociedade. Aonde, por serem do jeito que não agrada uma maioria, retraem parte de sua natureza afim de serem aceitos socialmente, ou precisam da empatia e do apoio de terceiros para que ações simples como o ato de se locomover confortavelmente lhes sejam assegurados.
Inclusive, não é de hoje que assuntos como segregações sociais e a necessidade de uma visão empática para com alguns grupos tem sido abordado em animes. Um ótimo exemplo disso é a produção Carole & Tuesday que, atrelado a narrativa da dupla em ter sucesso na música, vemos uma abordagem bem direta as questões políticas de imigração vividas atualmente em muitos países, que se negam a dar ou dificultam o processo de estadia estrangeira em suas terras, mas que neste caso, é envolvido e apresentado em um contexto mais fantástico aonde a questão xenofóbica é caracterizada em uma escala interplanetária.
Por isso, seja como um entretenimento relaxante em um dia de chuva ou para começar a exercitar uma visão mais tolerante – ou ainda os dois, por que não? – “Interviews with Monster Girls” se mostra como uma opção que vale a pena dar o benefício da dúvida e se aventurar. Por trás das cenas de comédia e do drama pré-adolescente com seus amores platônicos, você verá que existem muitos “demis” espalhados pelo mundo. E que apesar de não serem, e nem nunca terem sido, monstros a serem temidos, fazem parte de um incrível universo que talvez você desconheça, unicamente por estar vendo o mundo apenas pelo seu ponto de vista.
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