
Com a chegada da época natalina, é comum refletirmos sobre nossas ações, decisões e conceitos que acreditamos serem únicos e por vezes, imutáveis. Aproveito então toda esta atmosfera de bondade, solidariedade e reflexão para levantar o questionamento: O que faz uma família ser considerada perfeita? Seria ter todos os seus integrantes tradicionais? Seria o fato destes integrantes estarem juntos? Ou quem sabe o amor aplicado? Talvez fosse o conforto material adquirido para a família?

Mas então, tudo o que foge disso é um modelo familiar errado? Algo inferior? Uma falha?. Bem, para quem cresceu com uma constante influência dos animes, chegar a essa conclusão é um dos caminhos menos prováveis a se trilhar – embora haja aqueles que desafiem a lógica ou o bom senso. A verdade é que a tradicional configuração familiar (papai, mamãe e filhos) não é o sinônimo de felicidade que muitos querem acreditar. E as animações orientais já cantam essa bola há décadas. Na verdade estas produções carregam ideias potentes, que buscam um público sensível e capaz de absorvê-las, na esperança de florescerem e assim, contribuir na construção de um mundo mais digno e humano.
Um destes ensinamentos é que nem toda família saudável está relacionada a uma ligação sanguínea, número de integrantes ou sobre quem são essas pessoas. Na verdade, isto está bem mais próximo de quem nós de fato gostamos e escolhemos para seguir conosco, do que qualquer ligação biológica. E no que diz respeito a isso, obras como Buddy Daddies e Digimon podem nos ensinar algo sobre.

Em Buddy Daddies, por exemplo, vemos como dois homens que apesar de não terem nada além de uma relação de coleguismo entre si, reorganizam o dia-a-dia e lutam contra tudo e todos para garantirem a chance de criar uma garotinha que entra na vida de ambos e acaba tendo dois papais. É bem verdade que, na história, parte do fato da menina estar órfã é culpa dos dois. Mas seria bem cômodo para a dupla deixar a criança largada a própria sorte depois que os próprios progenitores rejeitaram a prole.

E por falar em pais ausentes, Kotaro vai morar sozinho também é um exemplo – um pouco mais fantasioso, mas ainda bem próximo da realidade – de como pessoas que surgem na sua vida podem ser aquelas que vão cuidar de você, tanto quanto, ou até mais, que uma mãe, um pai ou irmão. Eu digo que esse anime é um pouco mais fantasioso porque, em termos gerais, nenhuma criança de 4 anos moraria em um apartamento, cozinharia e falaria seu próprio idioma de maneira formal sem a ajuda de alguém. Mas, a título de exemplo, aqui temos uma história emocionante de como pessoas se conectam com pessoas. E mesmo alguém completamente abandonado pela família biológica, pode construir a sua própria, onde estas pessoas, que sequer tenham o mesmo sangue, possam lhe querer bem, independente dos traumas que essa pessoa tenha ou das dificuldades que tal escolha acarrete.

Esse é o mesmo princípio que norteia a história familiar de Izzy em Digimon Adventure, que embora não seja filho biológico de seus pais, não deixa de ser mais querido por ambos, uma vez que esse assunto vem a tona em um dos episódios do anime. E particularmente falando, não me surpreenderia se descobrisse que um dos motivos para o garoto se desenvolver tanto intelectualmente viesse da necessidade de se provar “necessário” para os pais.
Logo, é certeiro afirmar que estes animes e tantos outros como Poco’s Udon World; Malevolent Spirits: Mononogatari; Naruto; Jujutsu Kaisen e Spy x Family, podem ser fontes de grandes ensinamentos. Dentre os fãs de longa data desse tipo de animação, não são raros os casos em que alguém acaba por absorver algum conhecimento ou mesmo um rumo para a própria vida. Quem costuma prestar atenção e mergulha para além das animações de alta qualidade e lutas com superpoderes, pode enxergar valores e perspectivas que acabam por construir um humano íntegro e prazeroso de estar por perto. É óbvio que isto não é um discurso do tipo “queimem os héteros irresponsáveis, abandonadores de crianças!”. Contextos precários e pessoas de mau-caráter existem em todos os âmbitos, independente de gênero, sexo ou orientação sexual. A questão é: você vai querer ser a pessoa amarga que reprova e até impede que essas configurações familiares existam, só porque elas não seguem um padrão que já se provou ser falho? Seja com dois homens, duas mulheres, um pai ou mãe solo, uma avó, alguém sem relação biológica ou mesmo os seus amigos, as múltiplas composições de uma família já são uma realidade. E lutar contra isso, é uma guerra perdida.
Feliz Natal.
*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não remete necessariamente a posição do ANMTV*
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