No final desta última semana, tivemos um caso emblemático para a comunidade de fãs de animes e mangás envolvendo a dublagem do anime Chainsaw Man, onde uma parcela de fãs raivosos por uma escolha feita na tradução da obra, resolveu atacar o dublador Guilherme Briggs em suas redes sociais com direito a tentativas de invasão e até ameaças à sua integridade física.
Por conta disso, viemos por meio deste editorial não só reforçar a nossa solidariedade ao referido profissional como também propor uma outra abordagem sobre o assunto. Não viemos aqui falar sobre o que pensamos do comportamento dos agressores, uma vez que acreditamos que, assim como nós, tanto outros portais como figuras conhecidas e influentes nos ramos dos animes e da dublagem e seus respectivos públicos, já deixaram bem claro suas avaliações gerais sobre o acontecido.
Também não iremos nos aprofundar sobre as minúcias e aspectos técnicos de adaptação de termos de obras de ficção para que as mesmas sejam consumidas nos formatos dublado ou legendado, uma vez que entre nós não há efetivamente pessoas que tenham uma propriedade considerável para explorar o assunto com profundidade e didática. A ideia que desejamos expressar através destes parágrafos é sobre uma discussão mais universal, por assim dizer, que envolve um problema crônico observado por nós entre o público que assim como quem vos escreve, tem também uma relação afetiva com uma ou inúmeras obras com as quais tem contato, sejam elas na forma de animes, mangás, jogos, HQs ou quaisquer outros que movimentam a chamada cultura pop como conhecemos.
Não é incomum encontrarmos em andanças pelos mais variados espaços virtuais, comentários de usuários como: “Não suporto a obra ou o artista X, porque a fanbase dessa obra ou desse artista é insuportável”, e outras verbalizações direta ou indiretamente relacionadas a isso. O convite aqui é pensar sobre que tipo de comportamentos estamos cultivando enquanto pessoas que dividem determinados gostos, assim como que recado estamos transmitindo indiretamente a outras pessoas que interagem conosco de alguma forma e são pouco familiarizados com o que gostamos, sejam essas pessoas familiares, amigos ou mesmo profissionais que de alguma maneira, ao explorarem tais conteúdos para os seus próprios ganhos financeiros, podem também ter algum tipo de relação afetiva com o produto, tal qual mantemos a nossa.
Pensemos juntos: se tantos grupos específicos de animes ou mangás estão tão ruins assim, seria errado também dizer que a comunidade no geral de fãs de animes e mangás está também tóxica e insuportável de se lidar? Se a resposta de você que está vendo essa pergunta for “não”, então que exemplos de comunidades de fãs você poderia sugerir de forma a atrair outras pessoas para esse agrupamento? E se a resposta for “sim”, você já analisou se você mesmo pode estar fazendo parte do problema ou da solução?
É preciso compreender que produções de cultura pop, sejam elas orientais ou ocidentais, são feitas para se perpetuarem e sustentarem financeiramente entre o máximo de pessoas possível. E que ao se difundirem, não há uma filtragem elaborada sobre quem pode consumir tais conteúdos ou até indicando se algumas pessoas irão ter relações saudáveis com tais produções. Muitos artistas ou obras não tem necessariamente culpa de seus admiradores e de suas respectivas condutas. No entanto, entendemos que é preciso uma amadurecimento na maneira como nos relacionamos com aquilo que tanto gostamos, que nos faz nos sentir bem e que de algum modo faz parte de nossas vidas.
Muitos de nós nos tornamos fãs de animes e mangás porque em algum momento tivemos contato com isso através de mídias de comunicação que facilitaram esse acesso, como a televisão aberta. A medida que mais fenômenos midiáticos foram sendo revelados em diferentes épocas, diversas gerações foram tendo contato com a mídia que gostamos, enquanto fãs mais antigos foram crescendo e graças a isso fomos nos tornando mais numerosos tendo como consequência de tal conjuntura, o aumento de nossa força para influenciar de modo considerável as decisões de profissionais e organizações que queriam explorar financeiramente o nosso nicho.
Porém, não acreditamos que seria de todo errado dizer que essa popularidade e esse crescimento desordenado começou a gerar uma divisão de subgrupos, que muitas vezes, tinham como objetivo, cultivar a sua paixão por uma mesma obra ou artista, e que também a medida em que o público foi se renovando, condutas típicas de indivíduos em certas fases da vida, como a adolescência, começaram a se repetir dentro de grupos de fãs, ocasionando assim, o pensamento de que o grupo de fãs de animes e mangás como um todo, não parece amadurecer sua relação com essa mídia e tem sempre se superado em seus erros.
Aos poucos, otaku deixa de ser um termo para agregar fãs de mídias orientais (especificamente japonesas) e passa a se equiparar ao uso original em japonês da palavra (fanático por alguma coisa em especial), servindo muitas vezes de contraexemplo a como se relacionar perante o consumo de animes e mangás atualmente e caindo em um uso que ganha cada vez mais ares pejorativos.
Portanto, o convite que fazemos a todos àqueles que leram até aqui e conduzem comunidades de fãs e aos próprios participantes de tais comunidades, é que haja algum tipo de esforço conjunto para criar espaços mais acolhedores e saudáveis. Para que se consiga absorver o que determinadas obras propõem e tirar delas os melhores ensinamentos possíveis a fim de que sejamos melhores não só como fãs, mas como seres humanos.
Sabemos que existem problemas específicos, que talvez poderiam ser melhor resolvidos em sessões de terapia com a iniciativa disso sendo individual. Mas acreditamos que nada nos impede de possibilitar espaços onde haja mais difusão de respeito mútuo e melhor direcionamento de críticas ou reclamações a serem feitas com quem é responsável por cuidar das obras que amamos, não só para que casos como o mencionado não se repitam mas para que, quem sabe, talvez possamos tirar um melhor aprendizado disso tudo para fazer com que o nosso próprio futuro seja show, top, demais, pic@ ou como quer que cada um decida chamar, mas sobretudo melhor e mais otimista.
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