Análise: Eu e Meu Avô Nihonjin | Uma aula sobre o passado

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Admito que antes de sentar e assistir Eu e Meu Avô Nihonjin, imaginei que seria algo maçante e desinteressante, no entanto, me peguei preso em sua narrativa e curioso para acompanhar o desenrolar dos acontecimentos. No fim, isto não chega a ser uma grande surpresa tendo em vista que o longa é baseado no livro escrito por Oscar Nakasato, que inclusive chegou a vencer o Prêmio Jabuti em 2012.

O projeto é uma animação brasileira, que teve direção de Célia Catunda (O Show da Luna/Peixonauta) e foi produzido pela Pinguim Content – com distribuição da H2O Filmes. O mesmo entrega um visual aconchegante, lembrando as páginas de um livro infantil e este vislumbre estético conseguiu despertar alguma lembrança remota que me fez mergulhar mais tranquilo em sua caminhada.

A trama ocorre na década de 1980, quando somos apresentados ao pequeno Noboru, que recebe como tarefa de casa conversar com seus avós e descobrir mais sobre o passado de sua família. Isso incomoda o garoto, pois ele não possui muita proximidade com seu avô – chamado Hideo – e se irrita com as muitas regras do mesmo.

Pinguim Content / Divulgação

Ao conhecer o avô, entendemos a irritação do neto, mas tudo vai caminhando para entendermos melhor a razão disso tudo. Com isso, o filme vai mesclando situações do passado – contadas pelo senhor levemente razinza e o presente, com Noboru interagindo com seus amigos, mãe e compreendendo melhor todo o ensinamento ancestral que vem escutando na casa de seus avós.

Hideo é realmente um senhor teimoso, um pouco razinza mas que preza muito pela cultura japonesa. Um típico pai de seu tempo, que evita demonstrar sentimentos, trata sua palavra como lei e não aceita diálogo com os filhos. Acaba sobrando para a mãe o papel de amenizar a situação. O mesmo ocorre com seu neto, em diversos momentos, ambos acabam se desentendendo e a avó precisa intermediar.

Ao aprofundar mais em sua juventude, vamos entendendo toda a situação e observamos como foi a vinda de Hideo ao Brasil – para trabalhar em uma fazenda de café – e todos os problemas que o mesmo passou. Ele sempre foi desconfiado dos brasileiros, pois sua primeira impressão não foi agradável, todavia sempre se mostrou solidário aos companheiros japoneses.

Pinguim Content / Divulgação

Hideo sofreu com o falecimento de sua primeira esposa – tratado de uma forma bem lúdica, por se tratar de um filme infantil, além dos problemas financeiros. Mas acredito que o momento mais culposo para este senhor ocorreu com seu filho caçula, chamado Haru e fruto de seu segundo casamento, de onde todos os seu três filhos vieram. Assim como Noboru, Haru não aceitava as coisas da forma que o pai queria e ambos costumavam se desentender.

A situação entre Haru e seu pai piora durante a Segunda Guerra Mundial – este é o terceiro filme que analiso em poucos dias onde este momento histórico se faz presente, já posso pedir música. Crescendo como jornalista, o rapaz publica um artigo sobre a derrota do Japão, o que enfureceu alguns japoneses residentes no Brasil que acreditavam na vitória de seu país de origem.

E, neste momento, me vi intrigado. Sabia que os japoneses haviam sofrido perseguição no Brasil por conta de nossas nações estarem em lados opostos, até mesmo com projetos de campos de concentração surgindo por aqui. Mas não imaginava que parte deles acreditavam na vitória do Japão e ameaçavam aqueles que sabiam do verdadeiro fato, sendo este o ocorrido com o jovem Haru e o principal motivo da separação dele e de sua família.

Pinguim Content / Divulgação

A falta do tio em sua vida, deixa o pequeno menino de 10 anos curioso e questiona seu avô a todo momento sobre o paradeiro do mesmo. Sendo um assunto difícil, Hideo reflete sobre o ocorrido e isso ajuda a aproximar mais estes dois.

Achei a construção de afetividade entre Noboru e seu avô algo muito natural, clichê de certa forma, mas ainda assim orgânico. Este não é o primeiro projeto que mostra tensão entre diferentes gerações, mas como muitos sabem, não importa se a história é repetida e sim como a desenvolvem e esta animação faz um trabalho digno.

Há um paralelo entre Haru e Noboru, sendo que ambos são aquela rachadura que faz o terremoto acontecer. Nenhum dos dois teme expor suas opiniões e ideias na frente de um senhor que, claramente, não as aceitará de forma tão calma e ainda assim o fazem, sendo fiéis ao que são e mostrando a Hideo que diferenças de pensamento existem e é preciso saber lidar com elas.

Se você é um amante de momentos históricos ou apenas gosta de uma boa história contada pelos mais velhos, Eu e Meu Avô Nihonjin pode ser uma boa pedida. Talvez um passeio de escola? Apresentar um momento onde o passado do Brasil e do Japão conversam entre si pode ser algo bem interessante também. Fica a dica.

Para quem está curioso, nihonjin significa japonês.

Nota: 9/10

Agradecimentos a Pinguim Content pelo envio antecipado do material.

Eu e Meu Avô Nihonjin já está em cartaz nos cinemas brasileiros.

*As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não remete necessariamente a posição do ANMTV*